Nas últimas semanas, passei um bom tempo analisando conteúdos de terapeutas que fazem lives e postam vídeos no Tik Tok. Vi muita algumas pessoas apresentando informação de qualidade, explicando conceitos psicológicos de forma acessível e com respeito pelo sofrimento humano. Mas vi também algo que me preocupou muito: o que chamo de terapeutas predadores.

Quem são eles?
São terapeutas que se aproveitam da vulnerabilidade psicológica de quem está em busca de acolhimento e alívio da dor para vender promessas milagrosas, usando discursos emocionais manipulativos e técnicas persuasivas questionáveis. E o pior: no Brasil, qualquer um pode se intitular terapeuta. Não existe uma regulamentação específica para isso, o que abre margem para que indivíduos sem qualificação ofereçam “tratamentos” sem qualquer base científica ou preparo psicológico pessoa para exercer esta função.
Analisando minuciosamente o discurso de vários desses terapeutas, percebi padrões perigosos, que vou compartilhar aqui para te ajudar a identificá-los:
1. Gatilhos emocionais e linguagem sensacionalista dos terapeutas predadores
Em vez de informar com responsabilidade, muitos desses terapeutas predadores apostam em narrativas carregadas de emoção, choque e até descrições explícitas de traumas. Eles sabem que isso prende a atenção e mexe com a audiência, mas fazem isso sem o devido cuidado, sem oferecer suporte para quem pode se sentir impactado.
Um exemplo preocupante que encontrei foi a forma como falam sobre abusos infantis. Um dos discursos dizia algo como:
“Muitas vezes você teve um toque lá atrás, lá quando era uma criança, alguém tocou em você ou fez você tocar num adulto. Muitas vezes você era só uma criança e nem sabia o que estava acontecendo.”
Isso não só pode reativar memórias traumáticas para quem já viveu algo assim, como é uma abordagem completamente irresponsável e antiética. Falar sobre traumas exige cuidado e preparo. Nenhum profissional sério trata temas tão delicados dessa forma.
2. Promessas de cura e soluções mágicas
A vida é complexa, e superar dificuldades emocionais leva tempo, trabalho e, muitas vezes, suporte profissional adequado. Mas os terapeutas predadores vendem atalhos. Prometem que, em poucas sessões, conseguem “desbloquear” traumas profundos e transformar sua vida.
Na minha pesquisa identifiquei muitas falas na como:
“A mente impede a gravidez! Se desbloquear, você consegue engravidar.”
Isso é irresponsável e cruel. A fertilidade envolve uma infinidade de fatores biológicos e psicológicos, e dar essa impressão de que o problema é puramente emocional pode gerar frustração e culpa em quem já está sofrendo.
3. Discurso determinista e simplista
Outro padrão que identifiquei é a redução de problemas complexos a uma única causa, sem considerar os múltiplos fatores envolvidos. No caso da sexualidade, por exemplo, vi discursos como:
“Se você não consegue ter orgasmo ou sente dor no sexo, pode ter um trauma de infância mal resolvido.”
Claro que experiências passadas podem influenciar a vida sexual, mas afirmar isso como verdade absoluta ignora questões médicas, hormonais e relacionais. Essa abordagem simplista não ajuda, só gera mais culpa e insegurança.
4. Venda agressiva de serviços
Ao final dessas falas chocantes e dessas promessas de transformação rápida, o que acontece? Vem a oferta de um serviço pago. E não é só uma recomendação discreta. Esses terapeutas predadores transformam a dor das pessoas em estratégia de vendas, criando uma sensação de urgência:
“Se você sente isso, precisa de uma sessão comigo. Atendo online, é só agendar.”
Isso não é psicoeducação, isso é exploração emocional.
5. Falta de embasamento científico
Por fim, a cereja do bolo: não há qualquer menção a estudos, literatura científica ou mesmo à base teórica dessas intervenções. Psicólogos, médicos, psiquiatras e outros profissionais da saúde se baseiam em ciência, em pesquisas revisadas e em métodos testados. Os terapeutas predadores só se baseiam no próprio discurso e na autoridade que criam para si mesmos.
Como se proteger desses discursos manipulativos?
Agora que você já conhece alguns dos sinais, aqui vão algumas dicas para não cair nesses golpes:
✅ Desconfie de promessas milagrosas. Mudanças emocionais levam tempo e esforço, não existe “desbloqueio” mágico.
✅ Preste atenção à linguagem. Profissionais responsáveis explicam, não chocam. Cuidado com falas sensacionalistas.
✅ Pesquise a formação da pessoa. Psicólogos, psiquiatras e outros profissionais regulamentados têm registro em seus respectivos conselhos. Se não há clareza sobre a qualificação, sinal de alerta.
✅ Cuidado com quem te faz sentir culpa ou medo ou que tem uma solução muito fácil e só ele sabe o caminho. Manipuladores fazem isso para que você dependa deles.
✅ Acompanhe profissionais sérios. Se você quer informação de qualidade, siga quem tem compromisso com a ciência e a ética.
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